
Padre Jorge Aquino.
Certa vez, no início desse ano, eu estava lendo uma ótima exposição feita pelo teólogo, palestrante e autor Brian D. McLaren, sobre a possibilidade de viver sem ter medo da influência das mídias sociais acerca da Teoria Racial Crítica. Em sua resposta, Brian contou uma história que se passou com ele, alguns anos atrás, ou seja, antes mesmo que a TRC fosse um assunto amplamente difundido.
Ele estava dirigindo com um de seus familiares para um aeroporto perto de onde ele morava, na Flórida. Esse seu familiar era um firme apoiador de Trump, e profundamente preocupado com movimentos como Black Lives Matter e com tudo o mais que a Fox News lhe disse para temer. Enquanto eles estavam no automóvel, esse seu parente fez uma crítica a Colin Kaepernick (ex jogador de futebol americano e ativista dos direitos civis) e Brian demonstrou que apoiava o ativista negro. Eis que, de repente, ambos se viram à beira de uma discussão.
Eles passaram uns dois ou três minutos em um silêncio tenso, até que passaram por uma placa que dizia: “Entrando no condado de Lee”. Nesse momento Brian começou a contar um pouco de história a seu parente. Ele disse: “Acabamos de entrar no condado de Lee. Antes de 1887, esse local fazia parte do condado de Monroe. Mas as pessoas locais queriam seu próprio condado e precisavam de um nome para ele. Não posso deixar de me perguntar por que os floridianos, em 1887, batizariam seu novo condado em homenagem a Robert E. Lee, o líder da confederação e defensor da escravidão, o general que perdeu a Guerra Civil”.
Naquele momento seu parente nada disse, mas ficou com uma postura reflexiva. Nos instantes seguintes a tensão começou a se dissipar. Brian disse: “Hoje, cerca de um quarto de Fort Myers, a maior cidade do condado de Lee, é negra. Se os negros aqui precisassem ir ao tribunal, eles teriam que passar por uma grande estátua de Robert E Lee antes de entrar no tribunal. Então, quando estiverem diante do juiz ou do conselho do condado, veriam um enorme mural de Robert E. Lee atrás deles. Não posso deixar de me perguntar como isso seria para eles”.
Houve um momento de silêncio e, depois de alguns momentos, o parente de Brian disse: “Uau! Eu nunca pensei nisso dessa maneira antes”.
Segundo afirma Brian, ele não guarda a ilusão de que seu parente tenha desistido de assistir a Fox e que tenha passado a votar nos democratas, depois daquele diálogo. Mas ele afirma que àquele diálogo fez surgir um pequeno momento de empatia que os levou a um lugar que nenhum argumento jamais poderia ir. Como seria bom se esses pequenos momentos se somassem!
Certamente momentos assim são raros. Mas não podemos deixar de imaginar o que aconteceria se mais pessoas praticassem mais essas formas de convidar os outros para fora do debate e do medo, para buscar a empatia e a compaixão. Mesmo sem um ardoroso debate, o parente de Brian compreendeu que existe uma estrutura social antiquíssima que dá suporte ao racismo em suas mais diversas formas. E mais, ele percebeu como esse passado influencia decisões, as políticas públicas e as posturas daqueles que exercem o poder religioso, policial, escolar, jurídico e político.
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