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COMENTÁRIO AOS 10 MANDAMENTOS - 5º Mandamento. “Honra teu pai e tua mãe"

Foto do escritor: Reverendo Padre Jorge Aquino ✝Reverendo Padre Jorge Aquino ✝

Atualizado: 28 de mar. de 2023



Reverendo Jorge Aquino.

5º Mandamento. “Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que o Senhor , teu Deus, te dá” (Êxodo 20:12).

Chegamos, agora, ao quinto mandamento da Lei de Deus. E neste mandamento, de acordo com muitos comentaristas, encontramos uma espécie de ponte entre àquelas obrigações que temos para com nosso Deus e as que temos para com nosso próximo. Desta forma, este comando específico, que trata de nossa relação para com nossos pais, acaba servindo de uma espécie de elo que une os quatro primeiros mandamentos aos cinco restantes. Um detalhe significativo e que também deve ser considerado, é que, assim como o anterior, este quinto mandamento também se apresenta de uma forma positiva, portanto, afirmando assertivamente um comportamento e apresentando uma razão para tal. Com a finalidade de fazer um comentário que trate desse texto bíblico com uma certa profundidade, cremos ser importante verificamos que, em primeiro lugar, é necessário desenvolver o aspecto positivo que este quinto mandamento revela, refletindo sobre nossas obrigações que advém da apresentação das claras exigências nele contidas. Assim, se precisássemos condensá-lo, certamente poderíamos dizer que, segundo esse quinto mandamento, todos nós deveríamos honrar nossos pais, pois foram eles que nos deram a vida, nos mantiveram saudáveis e nos transmitiram a necessária educação formal e o conhecimento de Deus. Na verdade, quer queiramos ou não, refletimos em nosso caráter, muito do que eles são ou foram. Não é sem razão que chamamos nosso Deus metaforicamente de Pai. Na verdade, nossos pais, de certa forma, simbolizam e apontam para a presença divina em nossas vidas.

Assim, acreditamos que algumas questões podem ser levantadas acerca desse mandamento. E um deles bem poderia tratar acerca das pessoas que estariam incluídas nesse mandamento e que teriam por obrigação, agir obedientemente e com honra. Se fizermos essa pergunta para as pessoas, a maior parte delas vai responder que este texto se referindo aos nossos filhos menores ou adolescentes. Mas não é bem assim. É imprescindível que compreendamos que estamos lendo um versículo escrito dentro de uma cultura que está geográfica e temporalmente distante da nossa. Lá, na sociedade israelita presente na Palestina do 13º ou 14º século a.C. a realidade familiar era moldada pelo patriarcalismo. Desta forma, de acordo com o que ensina o pastor luterano Verner Hoefelmann, para que compreendamos adequadamente esse mandamento, é necessário que tenhamos uma leitura de como os mais velhos eram vistos na cultura patriarcal que marcava o ambiente no qual este texto foi escrito. Assim sendo, quando falamos acerca da honra que lhes devemos, temos que reconhecer que eles ocupam um lugar quase como se estivesse ao lado de Deus. E isso é assim, “Porque eles são portadores da experiência acumulada do povo de Israel com o seu Deus Javé. Cabe-lhes intermediar esta experiência à geração seguinte. (...) Numa sociedade que valoriza tanto as tradições do passado, é compreensível por que a palavra, a experiência e a decisão dos velhos têm tamanha importância. Eles preservam os conhecimentos adquiridos pelo grupo e devem coloca-los a serviço da sociedade. Por essa razão frequentemente encontramos pessoas idosas em posição de liderança ou destaque” (HOEFELMANN, In KILPP, 1982, p. 37). Assim, dentro dessa cultura que tanto valor dava aos mais velhos, é mais compreensível verificar que “As estipulações do pacto foram dirigidas a membros adultos da comunidade, do sexo masculino, pois tanto mulheres como as crianças eram receptáculos do pacto tão-somente no sentido em que se relacionavam com o marido-pai. (...) Assim sendo, o versículo 12 era muito mais do que uma exortação para filhos pré-adolescentes. Era uma obrigação imposta por estipulação pactual a membros maduros da comunidade” (HONEYCUTT, JR., In CLIFTON, Vol 1, 1986, p. 490).

Uma outra questão que poderia ser levantada aqui, procuraria explicar em qual sentido deveríamos honrar nossos pais? Para responder a esta questão, devemos buscar o texto mesmo do mandamento, no qual verificamos que é nosso mais absoluto dever honrar os nossos pais. Não há espaço para questionamentos. No entanto, quando o texto bíblico nos orienta a “honrar pai e mãe”, ele usa um verbo hebraico bastante significativo, que é o verbo kabed (כבד). Esta palavra chegou até nós vinda do do substantivo “kabod”, que pode ser traduzido como “honra” e “glória”. Esta é a mesma palavra que aparece em Números 22:15, onde lemos acerca dos príncipes moabitas: “Porém Balaque tornou a enviar mais príncipes, mais honrados do que aqueles”. Aqui verificamos que o autor usa a mesma palavra para se referir a alguns príncipes que são apresentados como honrados, respeitados, reconhecidos e temidos. Mas a aplicação desse termo não para por aqui. Ele se estende até mesmo à pessoa de Deus. Desta forma, citando as palavras de Clifton, “O verbo ‘honrar’ (kabed) está diretamente relacionado com o substantivo traduzido tanto como honra quanto como glória. Através de todo o Velho Testamento, a ‘glória de Deus’ (kabod) descrevia a natureza da presença de Deus (cf. Êx 33:18; I Reis 8:11; Is 6:3). Os filhos, portanto, deviam manifestar honra para com os seus pais e glória para com deus; glória e honra são idênticos” (HONEYCUTT, JR., In CLIFTON, Vol 1, 1986, p. 490). Desperta uma certa curiosidade saber que, na origem desse verbo está a ideia de “ser pesado” ou “ser abundante”. Com o tempo a palavra foi assumindo uma noção mais positiva, vindo a significar “ter um peso elevado” ou “ser alguém de peso” e, por via de consequência, “tornar-se honrado” e glorioso. É importante ressaltar que os tradutores do texto hebraico para o grego, na famosíssima tradução conhecida como Septuaginta, não utilizaram o termo doxa (glória) para o termo hebraico kabed, mas o verbo timao (timaw), que poderia ser traduzida como honra. Assim, “No grego não-bíblico timao era usado para designar a honra atribuída a superiores, dos homens aos deuses, e dos homens aos seus superiores, governantes ou hóspedes. (...) Desta forma, a Septuaginta usou uma palavra para designar ‘honra’, que significa o valor de uma pessoa ou de um objeto. Seguindo a influência da Septuaginta, pode-se parafrasear esta declaração: ‘Valorizarás ou estimarás o teu pai e a tua mãe’” (HONEYCUTT, JR., In CLIFTON, Vol 1, 1986, p. 490).

Em segundo lugar, é necessário que tenhamos uma clara e precisa noção do que esse quinto mandamento, por via de consequência, acaba nos proibido de fazer. Para Lutero, por exemplo, honrar pai e mãe significa que “Devemos temer e amar a Deus, de maneira que não desprezemos nem irritemos nossos pais e superiores, porém os honremos, sirvamos, lhes obedeçamos, os amemos e lhes queiramos bem” (LUTERO, 1983, p. 368). Portanto, para ele, precisávamos evitar o desprezo que nos leva à repulsa e, por óbvio, a agir de forma que a gerar irritação e impaciência em nossos pais. Mais que isso, o desprezo leva ao abandono, ao desamparo e à experiência de “matar em vida” quem deveríamos honrar. Quando não respeitamos nossos pais, nosso comportamento revela a falta do amor expresso em palavras e gestos; a falta do serviço nos momentos mais necessários; a falta do respeito frente ao que fizeram por nós e, lamentavelmente, a falta do necessário cuidado que nos leva a abandoná-los em sua velhice e deixa-los à própria sorte. Assim, existe neste mandamento, uma clara condenação aos maus tratos, o desprezo e o desarrimo dos pais idosos. Desta forma, “Honrar pai e mãe, portanto, também significa responsabilizar-se pelo seu sustento material, por sua proteção e segurança, quando o peso da velhice estiver esgotando suas energias vitais” (HOEFELMANN, In KILPP, 1982, p. 39). Para quem examina com o mínimo de cuidado o quinto mandamento, logo percebe que esse tipo de comportamento é frontalmente contrário à vontade de Deus, além de atrair para quem assim age, a clara condenação que pode ser encontrada em outros textos bíblicos relevantes, tais como Marcos 7:10-13 e Efésios 6:1-3. Desta forma, no primeiro deles, Jesus diz: “Pois Moisés disse: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser a seu pai ou a sua mãe seja punido de morte. Vós, porém, dizeis: Se um homem disser a seu pai ou a sua mãe: Aquilo que poderias aproveitar de mim é Corbã, isto é, oferta para o Senhor, então, o dispensais de fazer qualquer coisa em favor de seu pai ou de sua mãe, invalidando a palavra de Deus pela vossa própria tradição, que vós mesmos transmitistes; e fazeis muitas outras coisas semelhantes”. Aqui Jesus tanto critica os que abertamente amaldiçoam seus pais, quanto os que, querendo se passar por pessoas religiosas e santas, se servem da lei do Corbã e dizem que vão entregar tudo o que possuem à Deus, para dessa forma, ficariam sem ter a obrigação de sustentar seus pais em sua velhice. No texto de Efésios 6:1-3, Paulo ensina claramente: “Filhos, obedecei a vossos pais no Senhor, pois isto é justo. Honra a teu pai e a tua mãe (que é o primeiro mandamento com promessa), para que te vá bem, e sejas de longa vida sobre a terra”. A clareza do ensinamento paulino nos faz calar na certeza de que nada mais forte do que isso pode ser dito. Apesar disso, é importante compreender como se materializa essa maldição sobre os filhos que descuidam de seus pais. Para tanto, recorremos a Cole, que nos orienta ao pontuar que, “A promessa divina, contudo, é mais clara aqui, produzindo seus resultados na sociedade. Os que constroem uma sociedade na qual a velhice ocupa lugar de honra podem esperar confiantemente desfrutar do mesmo lugar algum dia. (...) Este mandamento é parte da atitude geral para com a velhice em Israel (como símbolo e, idealmente, personificação da sabedoria prática da vida), elogiada em todo o Velho Testamento (Lv 19:32), e encontrada em muitos outros povos antigos” (COLE, 1986, p. 152).

Por fim, em terceiro lugar, cremos ser necessário que compreendamos o que este mandamento destaca e que deve ser apresentado para os que nos cercam em nossos dias. Pensando nisso, e reconhecendo as enormes diferenças existentes entre nossa sociedade e àquela que produziu os Dez Mandamentos, precisamos destacar que, (i) uma primeira observação surge quando compreendemos que, ao nos referirmos a “pai e mãe”, não estamos, necessariamente, querendo nos referir apenas aos pais biológicos. Hoje, existem muitas famílias compostas por filhos que foram adotados ou, em inúmeros outros casos, famílias nas quais os avós - ou outro parente – acaba assumindo a condição de pai o mãe. Por óbvio, àquele respeito que o quinto mandamento exige que tenhamos para com nossos pais biológicos, seja estendido à essas pessoas que acabaram assumindo esse múnus e essa obrigação de criar, sustentar e educar. Assim, a formatação da família mudou, e em razão disso, também precisamos adaptar o texto à nossa realidade. Da mesma forma, (ii) uma segunda observação importante é àquele que deveria nos levar a questionar a ausência de políticas públicas para com as pessoas mais velhas que, na verdade revela ser fruto de uma cultura que cultua apenas a juventude. Assim, tal comportamento que nos leva a cuidar dos nossos velhos “não é muito popular em nossos dias, quando a juventude é adorada, e a velhice temida ou desprezada. O resultado é a loucura que leva homens e mulheres por permanecerem eternamente jovens, e acabar descobrindo ser isso impossível” (COLE, 1986, p. 152). Essa é a sociedade na qual as pessoas não apenas fazem de tudo para não se parecerem velhas (aplicação de botox, harmonização facial, uso de implantes, silicone, etc.), mas também evitam a todo custo falar sobre a velhice. Um outro elemento (iii) que devemos registrar aqui é que, “num século em que tão grande parte da educação é efetuada além dos limites da unidade familiar, o mandamento serve como lembrete solene, não somente da necessidade de uma vida harmoniosa, mas também das responsabilidades no tocante à educação religiosa que recai tanto sobre os pais quanto sobre os filhos” (CRAIGIE, In ELWELL, Vol 1, 1988, p. 456). Em outras palavras, as famílias precisam resgatar a prática de ensinar os valores e princípios bíblicos que deve nos levar a honrar nossos pais. Por fim, um outro (iv) elemento que precisamos denunciar é a naturalidade com que nossa sociedade desenvolveu a enorme dificuldade em reverenciar, obedecer ou agradecer o próximo. Muito ao revés, o que verificamos é que “naturalmente estamos feridos de orgulho e de ambição e com uma enorme dificuldade de aceitarmos nos submetermos a ninguém” (CALVINO, 1981, II.viii, 35). E é esse orgulho, essa empáfia e essa ambição que faz com que nos esqueçamos de nossos pais, apesar dos erros que tenham cometido.

É verdade que no mundo em que vivemos, há muitas variantes que tornam a obediência a esse mandamento algo difícil. Há muitas pessoas que hunca conheceram seus pais ou mães, porque foram abandonados quando criança. Imaginar que elas sejam capazes de, em algum momento, desenvolver algum senso de honra para com essas pessoas é algo bem difícil. Isso se torna ainda mais complicado se, além de ter escolhido se afastar dos filhos, tal pessoa foi objeto de alienação parental por parte do cônjuge que ficou com a guarda da criança. Esta criança crescerá e terá apenas uma versão em sua mente: a narrativa que ela ouviu desde sempre das únicas pessoas que confiavam.

Encerramos esse breve comentário com as palavras do ilustre reformador genebrino João Calvino, para quem, “O fim deste mandamento é que, como o Senhor Deus quer que seja guardada a ordem que Ele instituiu, devemos guardar inviolavelmente os graus de proeminência, conforme Ele os estabeleceu. O resumo, pois, de tudo isso é que, àqueles a quem o Senhor nos dá como superiores, devemos ter grande respeito, honrando-os, obedecendo-os e reconhecendo o bem que deles temos recebidos. Daqui se segue a proibição de que não diminuamos sua dignidade nem por menosprezo, nem por obstinação ou por ingratidão” (CALVINO, 1981, II.viii, 35). Creio que, já que vivemos em um mundo no qual o discurso de ódio é algo tão disseminado, se ao menos fossemos capazes de não diminuir a dignidade, nem menosprezar, por obstinação ou ingratidão, quem nos deu a vida, mas expressar o mínimo de respeito, já seria um bom começo.

 
 
 

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Caríssimos leitores, já que estamos com dificuldades de acrescentar novas fotos ou filmes nesse blog, você poderá nos encontrar, agora,...

1 Comment


peleofernandes
Jan 27, 2024

Meu querido irmão, tudo para a maior Glória de Deus.

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