REFLEXÕES SOBRE UM ANO QUE TEIMA EM NÃO TERMINAR
- Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
- 30 de dez. de 2020
- 3 min de leitura
Reverendo Padre Jorge Aquino.
Indiscutivelmente estamos diante de um ano que marcará a história da humanidade. E esta marca indelével, estará para sempre em nossas mente e em nossas vidas. No entanto, por incrível que pareça, temos a impressão de que 2020 ainda se estenderá por muitos meses de 2021 e, quiçá, de 2022. E acredito que a excepcionalidade de 2020 se dá por vários fatores. Em primeiro lugar, este foi um ano marcado por uma pandemia. Claro que a humanidade já passou por pandemias e enfrentou situações semelhantes. Mas aprendemos que todos esses momentos – como a gripe espanhola ou a peste negra – deixaram marcas bastante profundas nas vidas de todos aqueles que os vivenciaram. Estamos, portanto, marcados pela dor. A dor de quem passou por momentos cheios de agonia em um leito de UTI, mas conseguiu vencer a pandemia; a dor extrema daqueles que não lograram êxito e acabaram morrendo em razão do vírus; a dor de quem teve que acompanhar um parente ou conhecido nessa situação e, quando teve que encarar tamanha perda, também teve que sofrer a impossibilidade de velar seu ente querido. Em nosso país, estamos chegando à cifra das 200 mil vidas que foram ceifadas e creio não ser difícil compreender o tamanho de tanta dor que esse ano nos trouxe.
Mas o sofrimento não esteve presente apenas nos hospitais. Este foi um ano de completo abandono do nosso Meio-Ambiente, no qual boa parte do bioma amazônico e pantaneiro sofreu por causa da irresponsabilidade humana que causou queimadas desenfreadas; foi um ano em que o racismo estrutural atingiu níveis mundiais, revelando que as vidas negras importam (o grande legado de George Floyd) e que as mulheres não são propriedades de seus maridos, mas pessoas que precisam ser respeitadas como pessoas com direitos iguais aos homens. Dizer isso parece óbvio, mas nunca o feminicídio esteve tão presente entre nós.
Em segundo lugar - e aqui, lamento pelos que discordam de minha leitura -, esse ano foi marcado por uma atuação pífia (para dizer pouco), senão irresponsável e criminosa por meio das autoridades em todos os níveis (municipal, estadual e federal) e em todos os poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), quando foi preciso agir para preparar o país para a pandemia e quando foi necessário enfrenta-la com agilidade e competência. Quantas pessoas (governadores, prefeitos, secretários, etc.) não foram acusadas de desviar dinheiro do combate à COVID para encher seus bolsos? É caro que em todos os poderes da República e em todos os níveis dos entes federados, encontraremos destacadas exceções. Mas como pode um país assistir passivo que seu mais elevado dignitário não seja um exemplo e desdenhe dos mortos e dos que acreditam na seriedade da pandemia e, ainda por cima, seja tão irresponsável em adquirir as vacinas que salvam vidas?
Contudo, em terceiro lugar, esse foi, também, um ano de aprendizado e de crescimento. Aprendemos que é preciso se ter o outro e que é preciso cuidar dele. O isolamento social nos ensinou como os outros são importantes. Como é importante um simples abraço ou um aperto de mão. Mas era preciso ficar distante, para a segurança de todos. Aprendemos também que, para cuidar melhor dos outros – e de nós mesmos -, precisávamos estar com nossas mãos sempre limpas e com a máscara sempre no lugar certo. Aprendemos que somente o amor nos faria deixar de ir onde costumávamos ir e fazer o que costumávamos fazer (aglomerar e festejar), para evitar o contágio e a possível disseminação do vírus para nossos entes queridos.
Todos nós passamos por dificuldades, por dores, perdas e sofrimentos inenarráveis. Mas todos nós sabemos que haverá um amanhã em que poderemos voltar a abraçar sem medo as pessoas que amamos e a voltar a festejar a vida com plenitude de alegria. Que venha 2021 – ainda que com um gosto de 2020 -, mas que venha com a certeza de que sairemos da falta de perspectiva e vislumbraremos a esperança mais uma vez.

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