Quem pode fazer Casamento Religioso com Efeito Civil?
- Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
- 17 de dez. de 2018
- 4 min de leitura

Reverendo Padre Jorge Aquino.
Esta pode parecer uma questão sem muita importância, no entanto, não é bem assim. Este é um tema significativo porque boa parte dos casamentos realizados em nosso país são religiosos com efeito civil. Por isso é importante refletir um pouco mais sobre ele. Creio que existem pelo menos três informações importantes que precisam ser colocadas acerca desse assunto.
Em primeiro lugar, o casamento religioso com efeito civil está previsto em nosso ordenamento jurídico. O nosso Código Civil preceitua em seus Artigos 1515 e 1516 as normas para a validade desse tipo de casamento. No Artigo 1515, o legislador diz que “O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração”. Para que possa produzir efeitos, é preciso observado os impedimentos dos Arts 1521 e 1522. O Artigo seguinte pontua que: “O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil”. Assim o casamento religioso recebe o mesmo tratamento no que diz respeito aos requisitos exigidos para o casamento civil e que o registro civil do casamento religioso deve ser feito em até noventa dias depois de sua celebração, desde que exista uma habilitação prévia.
Notemos que existe ainda a possibilidade de que o Cartório reconheça um casamento religioso feito sem a prévia habilitação. É o que vemos em na lei n 6.015, de 31 de dezembro de 1973, Título II, Capítulo VII – Do registro do casamento religioso para Efeitos Civis, em seu Art. 74 que diz, In verbis: “O casamento religioso, celebrado sem a prévia habilitação, perante o oficial de registro público, poderá ser registrado desde que apresentados pelos nubentes, com o requerimento de registro, a prova do ato religioso e os documentos exigidos pelo Código Civil, suprindo eles eventual falta de requisitos nos termos da celebração”. Aqui já temos uma clara delimitação sobre o tipo de cerimônia de que trata o Artigo em pauta e, portanto, do oficiante dessa cerimônia.
Em segundo lugar, o casamento religioso com efeito civil deve ser realizado – como o próprio nome diz – por uma autoridade religiosa, não um leigo. Uma vez que estamos em Estado laico, ou seja, já que o Brasil não possui religião oficial, todas as religiões podem celebrar esse tipo de casamento. Segundo ensina Sílvio Venosa (Vol 6, 2002, p. 105), “A lei não distingue a modalidade de religião, todos os credos moralmente aceitos, que não contrariam a ordem pública são válidos”. Para tanto, exige-se que a religião – enquanto instituição pública de direito privado – exista e esteja regulamentada pelas leis nacionais por meio de sua inscrição no CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas). Ademais, exige-se também que tal religião se faça representar por meio de um ministro religioso a ela ligado. Discutindo acerca do caráter contratual do casamento, Washington Monteiro comenta que “no casamento não basta o elemento volitivo, tornando-se igualmente necessária a intervenção da autoridade eclesiástica, se religioso, ou da autoridade civil, se meramente laico, para sancionar e homologar o acordo” (Vol 2, 1999, p. 13). Ou seja, a vontade do oficiante é também necessária para o casamento religioso, tanto quanto a da autoridade civil quando o casamento for laico. O ideal é que esse ministro religioso seja alguém que tenha a formação teológica e religiosa necessária para o exercício de suas práticas. O celebrante, deverá ter como comprovar sua ligação com a religião, por meio de uma carta expedida pela autoridade religiosa a quem o ministro está ligado. Isso significa que, se alguém que não é ministro ordenado de nenhuma religião legalmente instituída, se faz passar por ministro religioso com ou sem a anuência de tal ministro, comete crime de exercício ilegal da profissão e de falsidade ideológica.
Em terceiro lugar, o casamento com efeito civil possui uma dimensão legal, embora celebrado por um ministro religioso. Eis a grande vantagem do casamento religioso com efeito civil. Muito embora exista uma diferença entre o casamento (que é um ato civil) e o matrimônio (que é um ato religioso), neste tipo de cerimônia, o ministro religioso celebra um matrimônio que tem, também, a validade de um ato civil, no caso, o casamento. O ministro assume, portanto, a função ad hoc de um juiz de paz.
Do que vimos acima, podemos concluir que: 1) uma cerimônia realizada fora do cartório, sem um legítimo representante de uma religião instituída que tenha inscrição no CNPJ, não é a mesma coisa que um casamento religioso com efeito civil. 2) Uma cerimônia que reproduza os mesmos elementos de uma liturgia religiosa (bênçãos, trocas de alianças, votos religiosos, declaração de “marido” e “mulher”, etc.), se realizado por alguém que não foi habilitado e designado para isso, configura não apenas exercício ilegal da profissão, mas uma enganação em estado puro, é uma verdadeira fraude. Tomem cuidado com gente assim.
Caros leitores, vivemos em um país onde a prática da religião é livre e depende apenas do arbítrio de cada um. Se você deseja realizar uma cerimônia informal, em um local bucólico e com alguém que diga algumas palavras que lhe agrade, case-se no cartório e, em seguida, procure um palestrante ou celebrante de casamentos e você ficará satisfeito. Existem muitos por aí. No entanto, se você procura realizar uma Cerimônia Religiosa com Efeito Civil, a sua única possibilidade é procurar um ministro religioso de qualquer uma das inúmeras religiões que atuam legalmente nesse país e entregar a ele a habilitação expedida pelo Cartório. Ele saberá o que fazer. Nenhum Celebrante de Casamento que não seja, também, ministro religioso de uma religião instituída conforme a lei de nosso país, pode se auto-proclamar juiz de paz eclesiástico. Fique atento com esse tipo de gente que quer apenas enganá-lo para ganhar dinheiro.
Referências bibliográficas:
Novo Código Civil: exposição de motivos e texto sancionado. Brasília: Senado Federal, 2003
DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. São Paulo: Sarayva, 2006
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. Vol 2. São Paulo: Sarayva, 1999
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. Vol 6. São Paulo: Atlas, 2002
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