Padre Católico-Romano pode realizar matrimônios fora da paróquia?
- Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
- 1 de mar. de 2020
- 9 min de leitura
Muitas vezes sou perguntado pelas noivas que me procuram se um Padre Católico-Romano pode celebrar o sacramento do Matrimônio fora do templo. A resposta é simples: sim. Um padre Católico-Romano pode celebrar o sacramento do Matrimônio fora do local de culto. No entanto o que as pessoas não entendem é que esta é uma exceção e não a regra. O Código de Direito Canônico, em seu Cânone 1115 assim se expressa: “Celebrem-se os matrimônios na paróquia, onde qualquer das partes tem o domicílio ou quase-domicílio ou residência durante um mês, ou, tratando-se de vagos, na paróquia onde atualmente se encontram; com licença do Ordinário próprio ou do pároco próprio podem celebrar-se noutro lugar”. Como se pode perceber, há sim a possibilidade de que o matrimônio seja feito “noutro lugar”, porém, com a licença do Ordinário próprio. E que é ele? É o Bispo da Diocese. Em outras palavras, a regra é que o Matrimônio ocorra na Paróquia, mas, em condições excepcionais e extraordinárias, com a licença do bispo, a cerimônia pode ocorrer em outro lugar. Casos assim, ocorrem quando um dos noivos está hospitalizado e o sacerdote tem que se deslocar até lá, para presidir a cerimônia.
Quase a totalidade das Dioceses no Brasil (senão a totalidade) já deixaram bem claro sua posição concordando com o Direito Canônico Romano, como é o caso, em primeiro lugar, da Arquidiocese de Fortaleza que assim prescreve em seu Diretório Pastoral Litúrgico-Sacramental, promulgado em 2003, no parágrafo 354: “Quanto aos casamentos em residências, clubes, buffets, sítios ou outros lugares não destinados usualmente ao culto, são expressamente proibidos, em qualquer caso”.
Em segundo lugar, o mesmo pode ser verificado na Diocese de São José dos Pinhais onde em seu Diretório para o Sacramento do Matrimônio, à página 34 diz: “d) É proibido o casamento em capelas particulares de colégios, hospitais, seminários, casas particulares, casas de retiro, restaurantes, clubes ou salões de festa, bem como em ocasião de encontros de casais”.
Leitura similar também pode ser vista, em terceiro lugar, no Diretório dos Sacramentos a Arquidiocese de São Paulo que diz nos números 297 e 298: “O lugar próprio para a celebração do matrimônio é a paróquia onde uma das partes tiver domicílio, quase domicílio ou residência há um mês, ou, tratando-se de vagantes, na paróquia onde de fato se encontrarem (cf. cân. 1115). Não são permitidas celebrações de casamentos em restaurantes e buffets”.
Podemos ver o mesmo conteúdo, em quarto lugar, nas Diretrizes sobre o sacramento do Matrimônio na Província de Butucatu, ligada à Diocese de Lins em seu item 33 assim se expressa: “Na Província de Botucatu, para preservar o caráter religioso da celebração do matrimonio, não será dada autorização para a celebração do matrimonio católico em clubes, bufês, salões, chácaras e sítios de recreio, recanto de lazer e diversão, fazendas, etc.”.
Em quinto lugar, a Diocese de São José dos Campos esclarece: “Para que haja clareza no que diz respeito aos casamentos ‘fora do templo católico’, e considerando o exposto acima, esclarecemos que: ‘O lugar próprio para a celebração do Matrimônio, assim como de qualquer outro sacramento, é a igreja paroquial onde uma das partes tiver domicílio, quase domicílio ou residência há um mês, ou, tratando-se de vagantes, na paróquia onde de fato se encontrarem’ (cf. cân. 1115). São permitidas celebrações de casamentos em capelas e igrejas da mesma paróquia ou de outra, a critério do pároco da mesma. Não será permitida a celebração do Matrimônio ‘fora do templo católico’, ou seja, locais particulares, tais como: chácara, buffet, restaurante, clube, ‘capela particular’ e outros ambientes similares, a não ser em raras exceções abaixo relacionadas, mas somente, com a autorização do ‘ordinário local’ (o Bispo Diocesano ou, na sua ausência, o Vigário Geral), através de requerimento do Pároco” (http://diocese-sjc.org.br/orientacoes-sobre-celebracoes-do-matrimonio-fora-do-templo-catolico/).
Em sexto lugar, a Paróquia Nossa Senhora da Piedade, em Novo Hamburgo, também fala sobre o tema quando afirma: “Para preservar o caráter religioso do Matrimônio não se dá autorização para celebração nupcial em clubes, salões, chácaras, sítios e fazendas. Para o casamento em domicílio, uma vez tendo sido consultada a Autoridade Eclesiástica competente, será dada licença somente por motivos justos e graves” (disponível em <http://paroquiadapiedade.com.br/formacao/oficios-do-vigario-geral/proibicao-do-matrimonio-fora-da-igreja>).
Em sétimo lugar, a mesma informação encontramos no site da Catedral Nossa Senhora Auxiliadora em Goiás. Lá se diz que: “O cânone 1.118, § 1 do Código de Direito Canônico estabelece: Cân. 1118 — § 1. O matrimônio entre católicos ou entre uma parte católica e outra não católica mas batizada celebre-se na igreja paroquial; pode celebrar-se noutra igreja ou oratório com licença do Ordinário ou do pároco. Portanto, a regra geral é de que não é possível aos católicos casar-se fora de lugares sagrados. Há uma importante razão espiritual para isso: o matrimônio é um vínculo natural que, entre os cristãos (sejam eles católicos ou não), foi elevado à dignidade de sacramento por Cristo Senhor (cân. 1.055). Portanto, a graça divina não anula a natureza, mas a eleva a uma ordem sobrenatural. Dada a natureza também sagrada deste vínculo, é prudente, conveniente e oportuno que sua constituição se dê dentro de um recinto sagrado, de maneira a expressar de forma mais plena o caráter sacro de tal instituição. Ou, caso se prefira colocar deste modo, é mais consentâneo com a teologia do sacramento que este seja celebrado no lugar sagrado, sobretudo pela existência aí do Ssmo. Sacramento, presença substancial de Nosso Senhor nos tabernáculos de nossas igrejas”. (Disponível em <http://www.catedralgo.org.br/multimidias/noticias/101-pode-se-celebrar-o-matrimonio-catolico-fora-do-espaco-da-igreja>).
Em oitavo lugar, a Diocese de Piracicaba tem suas Orientações e Normas Diocesanas para os Sacramentos publicados em seu site (https://diocesedepiracicaba.org.br/capa.asp?p=480) e, ao tratar do lugar para o Matrimônio, o texto afirma: “280. O lugar próprio para a celebração do matrimônio é a igreja paroquial onde uma das partes tiver domicílio, quase domicílio ou residência há um mês, ou, tratando‐se de vagantes, na paróquia onde de fato se encontrarem (cf. C.D.C. Cân. 1115). São permitidas celebrações de casamentos em capelas e igrejas da paróquia. São permitidas também em capelas de hospitais e escolas, bem como, em capelas de casas religiosas. Em relação às celebrações “extra‐templo” que seja consultado o ordinário local. Na Diocese de Piracicaba fica determinado que não serão permitidas as celebrações matrimoniais “extra‐templo”, ou seja, realizadas em salões de festas ou outros locais, com exceção de duas capelas particulares que além, de possibilitarem um contexto celebrativo religiosamente adequado, (…). 283. Não é permitida nenhuma ‘benção’ ou qualquer ação, dentro ou fora da Igreja, que simule os ritos da celebração do Matrimônio cristão ou que se pareça com o Sacramento”. Ressalte-se que este texto, além de proibir celebrações fora das paróquias, proíbe também que sejam realizadas bênçãos que simule o Matrimônio, nesses lugares.
Em nono lugar, o Diretório dos sacramentos da Diocese de Santos – 2019, tratando desse assunto afirma: “243 – O lugar próprio para a celebração do Matrimônio é a paróquia onde uma das partes tiver domicílio, quase domicílio ou residência há um (01) mês, ou, tratando-se de vagantes, na paróquia onde de fato se encontrarem. (cf. cân. 1.115) 244 – Não são permitidas celebrações de casamentos em restaurantes e buffets. Em outros espaços de encontros sociais, a permissão fica a critério do bispo diocesano. São permitidas celebrações de casamentos em capelas de hospitais e escolas, bem como em capelas de casas religiosas” (disponível em <https://www.diocesedesantos.com.br/wp-content/uploads/2019/05/diretorio-dos-sacramentos_versao_2018_02_22.pdf>, acessado em 20 de janeiro de 2020).
Em décimo lugar, para não deixar nossos leitores entediados, terminamos com a Diocese de Bauru que “reitera que os padres não têm autorização para celebrar cerimônia religiosa fora de seus templos. Os noivos de Bauru e região interessados em selar a união com a bênção de um padre católico necessariamente realizarão a cerimônia numa igreja da Diocese. Os religiosos não têm autorização para celebrar o sacramento em outros locais como capelas particulares, oratórios, salões de festa ou bufês, por exemplo. A informação foi confirmada ontem pelo bispo dom Caetano Ferrari, transferido para Bauru em meados de abril. Ele tomou posse no último dia de maio. A determinação, no entanto, antecede sua gestão. O matrimônio é uma celebração litúrgica. É religiosa, não é civil. As celebrações religiosas devem ser feitas, de forma preferencial, nos templos ou ambientes religiosos. É um ato público, litúrgico e oficial da igreja”, reitera o bispo” (https://www.portalpadom.com.br/casamento-catolico-so-e-feito-na-igreja/).
Mesmos os padres diocesanos sabem disso. Em décimo primeiro lugar, falando de uma forma muito clara, sincera e honesta, o Padre Luiz Alberto Kleina, Pároco Reitor do Santuário Nossa Senhora do Carmo em Curitiba, diz de uma forma objetiva e sem rodeios a verdadeira doutrina da Igreja Católica em seu site pessoal: “todos os sacramentos devem ser celebrados no recinto religioso do templo. Assim sendo, fica proibida a celebração do matrimônio em capelas particulares de colégios, hospitais, seminários, casas particulares, casas de retiros, restaurantes, clubes ou salões de festa, locais de eventos e similares. O matrimônio religioso seja celebrado na comunidade paroquial, seguindo as normas litúrgicas para um acontecimento tão importante como é o matrimônio. A Igreja paroquial foi o local onde os noivos receberam o batismo, a Eucaristia, a Crisma, nada mais significativo de que nela recebam, também, o matrimônio. É proibido fazer ‘simulação’ de sacramentos, por isso, não se pode nem mesmo dar a benção nupcial nesses lugares proibidos. O ritual sacramental deve ser todo ele, realizado no recinto religioso. Se, por acaso, existir alguma pessoa celebrando o matrimônio nesses lugares proibidos, com certeza não é um ministro católico romano e o matrimônio é nulo. Estamos falando do matrimônio católico romano e não de outras denominações” (Disponível em <http://padrekleina.org.br/santuario/casamentos/>).
Por fim, em décimo segundo lugar, citando um conhecido site romano: “Se você é membro da Igreja Católica Apostólica Romana e sempre sonhou se casar em um belo jardim, ou em uma praia, ou no topo de uma montanha me desculpe, mas este tipo de casamento em geral não é permitido! Se o padre com quem você conversou disse que você pode se casar à vontade, ele está errado. Das duas uma: Ou ele não é um Padre da Igreja Católica Apostólica Romana, ou ele está em desobediência a Igreja. Na minha opinião, padres desobedientes precisam ser denunciados! (…) Portanto: 1. O matrimônio deve ser celebrado somente nas Matrizes e Capelas provisionadas; 2. É proibido em clubes, hotéis, sítios, chácaras, fazendas e locais de lazer ou recepção” (Disponível em https://domvob.wordpress.com/2012/07/25/casamento-no-campo-na-fazenda-na-praia-sai-fora-catolico-e-furada/, acessada em janeiro de 2018. Negrito do autor).
Só espero que não ocorra com ninguém o que se segue abaixo e que aparece no site do Estado de São Paulo: “Padre é processado no Rio por realizar falso casamento”. O Autor da matéria é Clarissa Thomé, e ela aparece no O Estado de São Paulo em 12/11/2006, Vida&, p. A29: “A funcionária pública Roberta Ferreira di Fazio, de 30 anos, decidiu processar o padre que realizou seu casamento em maio deste ano ao descobrir que a cerimônia não tinha validade para a Igreja Católica. O evento foi considerado duplamente irregular, primeiro porque foi realizado em uma casa de festas, o que não é autorizado pela Igreja em algumas cidades, como Rio, Niterói e Nova Friburgo. Segundo porque o padre Alberto Ribeiro Morgado não tinha autorização para atuar fora de sua paróquia. Ele já havia sido punido em 2002 e ficou impedido de rezar missas, batizados e casamentos. Em 2005 recebeu uma autorização especial, mas vem desobedecendo seus superiores. Há um inquérito aberto na 6ª Delegacia de Polícia para apurar as denúncias. ‘Meu casamento virou um pesadelo. O padre atrasou uma hora e meia, período em que passei chorando, com 150 convidados esperando. E depois descobri que a cerimônia não tem valor’, desabafou Roberta (…). O bispo de Nova Friburgo, d. Rafael Llano Cifuentes, contou que Morgado foi ‘suspenso de ordem’ em 2002 por fazer cerimônias em clubes, fazendas e salões. ‘Algumas dioceses não admitem casamentos fora da igreja para evitar a banalização do sacramento’, explicou o bispo. (Disponível em <https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/323361/noticia.htm?sequence=1> Acessado em 01 de agosto de 2018).
Até onde eu sei esta deveria ser também a posição da Arquidiocese de Natal, já que ela faz parte da Igreja Católica Apostólica Romana. E era assim, desde sempre. Digo isto por que eu mesmo fui convidado por um padre dessa Arquidiocese para realizar um matrimônio, em seu lugar, porque o bispo de então havia descoberto que ele seria o celebrante. Ocorre que hoje, os padres da Arquidiocese de Natal estão realizando matrimônios em praias, hotéis, recepções, fazendas, etc,. Assim, acredito que a Arquidiocese de Natal, comparada com o que vimos acima representa uma clara exceção ao que afirma o Código de Direito Canônico. Interpelado por mim sobre essa situação, um padre da Arquidiocese de Natal me disse que o bispo assumiu essa postura para suprir a uma demanda do povo de nossa cidade. Contudo, se assim fosse, não estaríamos vendo padres de Natal realizando cerimônias de pessoas que estão vindo de outras tantas Regiões do Brasil. O que mais chama a atenção é que essa demanda – via de regra – parece surgir somente em um setor bastante abastado dos leigos da Arquidiocese. Isso nos faz pensar!
Eis um retrato da realidade hoje. Se a Arquidiocese de Natal, contrariando a prática e a norma de todas as demais dioceses Católicas do mundo, pretende contrariar o que diz o Código de Direito Canônico e tornar regra o que é exceção por razões no mínimo questionáveis, fica demonstrado o que realmente pensam das leis e normas que deveriam reger o comportamento dos clérigos e leigos da Igreja. Melhor e mais adequado do que descumprir a lei, seria mudar o que ela diz. Coerência, entendo, é fundamental.

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