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O ANGLICANISMO FORA DA CAIXA

  • Foto do escritor: Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
    Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
  • 29 de ago. de 2018
  • 4 min de leitura
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Reverendo Padre Jorge Aquino.

A expressão “Pensar “fora da caixa” é oriunda do inglês: “Think outside the box” e quer significar algo como “pensar livre das amarras convencionais”. Quanto a origem da expressão, há uma certa controversa. Para alguns, esta expressão teria surgido com o consultor americano John Adair em 1969, mas outros acreditam que ela teria sido criada por Mike Vance. Independentemente de quem tenha sido o criador da expressão, ter a possibilidade de pensar algo livre as amarras tradicionais e dos limites normalmente impostos é um grande desafio para todos nós. Quando aplicamos essa expressão ao Anglicanismo não é diferente. No entanto, acredito que existem três vantagens em pensar o Anglicanismo “fora da caixa”.

Em primeiro lugar, o Anglicanismo fora da caixa, verá a importância de supera a formatação apresentada pela “Comunhão Anglicana”. Aquilo que chamamos de “Comunhão Anglicana” é, na realidade, uma criação recente, se a compararmos com a história do Anglicanismo. Além do mais, ela esteve intimamente relacionada com o processo de expansão e colonização britânica nos últimos 400 anos. É claro que com a expansão do reino de Sua Majestade, era importante que clérigos acompanhassem essa expansão e, não apenas desse o necessário apoio religioso aos marinheiros e futuros governantes das Colônias, mas que também fossem guardiões da moral vitoriana e da cultura inglesa – que deveria se sobrepor aos usos e costumes locais.

No século XX, no entanto, o processo de descolonização que moveu a África e a Ásia acabou trazendo libertação também para as igrejas ao redor do mundo, que não precisariam mais se reportar à Igreja da Inglaterra. Surgem igrejas Anglicanas nacionais com suas próprias tradições, mas mantendo a Liturgia, os Credos históricos e o ethos Anglicano.

No entanto, a formação dessas Igrejas acabou criando a necessidade de que existissem instrumentos que mantivessem a unidade Anglicana sempre presente. Por isso surge, em primeiro lugar, a Conferência de Lambeth, e, em seguida, as Reunião dos Primazes, o Conselho Consultivo Anglicano, etc. Estes instrumentos de unidade produzia uma certa organicidade e univocidade ao Anglicanismo, o que foi algo importante, até que fomos chegando ao final do século XX.

No entanto, o fim do século XX não presenciou apenas o fim das “utopias fortes” ou das “verdades duras” (Liberalismo e Comunismo), mas também um momento de mudança paradigmática que pôs em xeque as identidades pessoais e institucionais. E é no bojo do que convencionou chamar de “pós-modernidade” que o Anglicanismo passou a conviver com sua crise de identidade e de unidade. Depois da crise de 2003, surgiram uma centena de igrejas Anglicanas conservadoras ao redor do mundo, reproduzindo até mesmo, certos aspectos da Comunhão Anglicana – como é o caso do GAFCON.

O que o Anglicanismo precisa compreender é que não dá mais para imaginar a existência de uma instituição internacional que tenha ingerência sobre a vida das Províncias individuais. No entanto, ao mesmo tempo, não podemos aceitar como natural a fragmentação do Anglicanismo. Eis a tensão em que vivemos hoje: nós rejeitamos a criação de instâncias que atuem como uma “cúria” Anglicana – à semelhança do que ocorre no catolicismo Romano – ao mesmo tempo em que resistimos a simplesmente romper e dividir o anglicanismo em partes que são incapazes de dialogar. Somente fora da caixa encontraremos a possibilidade de sair desse dilema.

Em segundo lugar, o Anglicanismo fora da caixa estaria realmente aberto a um diálogo. O diálogo ecumênico está no próprio DNA do Anglicanismo. Foram os Anglicanos que presidiram a Conferência Missionária mundial em Edimburgo (1910) estabelecendo padrões de comportamento ecumênicos para a atuação dos missionários das diversas denominações presente. Foram os Anglicanos quem protagonizaram a criação da Igreja Unida do Norte da Índia, bem como a Igreja Unida do Sul da Índia e outras experiências de ação ecumênica na Ásia. Houve uma imensa deferência no que dizia respeito às ordenações não-episcopais dos ministros vindos das Igrejas Presbiterianas, Metodistas, etc., mas tudo foi tratado com cuidado e respeito. Para os Anglicanos, o verdadeiro diálogo é diferente de um monólogo.

Hoje, existem centenas de denominações Anglicanas que usam a mesma liturgia (o Livro de Oração Comum), mantém a crença no episcopado histórico, batizam validamente, celebram a eucaristia com o Rito do LOC, utilizam o mesmo Ordinário, o mesmo calendário litúrgico e, no entanto, são tratados como se sequer cristãos fossem. Então o “ecumenismo” Anglicano só existe para os demais cristãos e não para os “Anglicanos” continuantes que, embora na diáspora – porque assumiram uma posição conservadora na década de 80 – não merecem um caminho de interlocução? Esse raciocínio é próprio de quem está preso dentro da caixa e teme que a tampa se abra e algo aconteça.

Finalmente, em terceiro lugar, o Anglicanismo fora da caixa entende que diferenças enriquecem mais do que a monotonia do discurso único e monocromático. É interessante poder escrever essa frase acima porque, normalmente quem defende o respeito aos diferentes acabam sendo justamente aqueles que pretendem se afirmar como os únicos e verdadeiros Anglicanos da galáxia e que, somente eles sabem o que realmente é ser Anglicano.

Ora, qualquer leitor minimamente atento do Novo Testamento sabe que nem mesmo a Igreja Primitiva tinha um só discurso e um só relato sobre Jesus. Muito ao revés. O cristianismo primitivo conviveu com partidos internos e com posturas que exigiram que, logo cedo, certas posturas e doutrinas fossem definidas. O primeiro e grande exemplo dessas posturas díspares no cristianismo primitivo pode ser verificado na relação entre o pensamento paulino e o petrino sobre o tratamento com aspectos da vida dos gentios. Foi preciso um concílio em Jerusalém para que essa questão fosse dirimida. Mas as cartas paulinas revelam o surgimento de outros movimentos cristãos que defendiam teses que contrariavam frontalmente o cerne do cristianismo.

Quando verificamos que as grandes divisões do Anglicanismo mundial, hoje, nada diz respeito às quatro afirmações do Quadrilátero ou mesmo à utilização do Livro de Oração Comum, realmente tenho a impressão que alguns Anglicanos precisam “sair da caixa” para poder conversar respeitando as diferenças.

Deixo aqui o desafio para que ouçamos as palavras de Cristo e sejamos capazes de reconhecer que, mesmo sem ter que criar novas instituições, deveríamos ser capazes de sentar e dialogar acerca do que é essencial, deixando o secundário para depois.

 
 
 

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