ESPIRITUALIDADE E FARISAÍSMO
- Reverendo Padre Jorge Aquino ✝

- 2 de jun. de 2021
- 3 min de leitura
Reverendo Padre Jorge Aquino
Faz muito tempo que entendo que as pessoas que se mostram as mais “espirituais” são exatamente aquelas mais difíceis da comunidade. Assumi minha primeira igreja no início de 1991. Dois meses depois, tivemos uma reunião com a liderança da comunidade cuja pauta era absurda. Aquelas pessoas estavam me pedindo para impedir que duas jovens da comunidade fossem impedidas de comungar porque usavam “calça comprida” dentro do templo.
Por mais que eu argumentasse que esse pedido era um absurdo porque carecia de lastro lógico, bíblico e canônico, eles assim desejavam. A certo momento do encontro eu fechei questão e disse que não faria aquilo. Imediatamente, o verdadeiro “eu” de cada um deles se manifestou. É surpreendente perceber quantos fariseus ainda freqüentam nossas igrejas e ocupam lugares de mando. É surpreendente que, ao invés de ser um espaço de libertação e fortalecimento, nossas comunidades se tornaram espaços de intimidação e escravidão.
Passando os olhos na obra de Brennan Manning (1934-2013), percebemos que ele tem a mesma opinião. Em certo momento de seu livro O impostor que vive em mim (Mundo Cristão, 2007), ele afirma que: “Paradoxalmente, o que interfere na relação entre Deus e o ser humano é a moralidade obstinada e a falsa piedade” (MANNING, 2007, p. 91). Esta referência é surpreendente. Geralmente a impressão que temos é que nossa relação com Deus é objeto de interferência das nossas opiniões e conceitos. Mas quando os aspectos morais passam a assumir a proeminência nessa relação, realmente algo muito estranho está acontecendo.
E o que está acontecendo é o retorno daquela realidade que foi enfrentada por Jesus: a religiosidade dos fariseus. Por isso Maninng diz: “Não são prostitutas nem cobradores de impostos as pessoas que encontram maior dificuldade em se arrepender; são os religiosos que julgam não ter motivo de arrependimento, tranquilos porque não quebraram nenhuma lei no sábado” (MANNING, 2007, p. 91). De fato, como é difícil para esse tipo de pessoa reconhecer suas posturas pecaminosas, internalizadas na forma de empáfia e arrogância. Eis as pessoas mais refratárias ao que diz Jesus e mas difíceis de se arrepender.
Eles encarnam exatamente o comportamento dos fariseus, na época de Jesus. É Manning que diz: “Os fariseus investem muito em gestos religiosos visíveis, em rituais, em métodos e técnicas, gerando, em tese, uma gente santa, mas também crítica, robotizada, sem vida e tão intolerantes com os outros quanto é consigo; pessoas violentas, exatamente o oposto do que significa santidade e amor” (MANNING, 2007, p. 91). Aliás, a santidade e o amor, que deveriam caracterizar os verdadeiros cristãos, acabam, realmente, dando espaço a um discurso de ódio e de intolerância para com todos os que não preenchem os requisitos de seu modelo de espiritualidade. Este é o tipo de gente espiritual que, de acordo com Antony De Melo, “consciente de sua espiritualidade, continua crucificando o Messias” (DE MELO, MANNING, 2007, p. 91).
Devemos sempre lembrar que Jesus não foi morto por assaltantes, estupradores ou assassinos. Ele foi morto, afirma Meanning, justamente pelas pessoas mais profundamente religiosas de sua época, pelos membros mais respeitados de sua sociedade e pelos que mais se apresentavam como puros e santos diante de Deus.
Que Deus nos torne aptos para compreender a importância da tolerância, da gentileza e do amor, como sinal maior de nossa santidade e de nosso compromisso com Ele. E, ao mesmo tempo, nos faça compreender que o caminho mais fácil das palavras vazias e dos gestos mecânicos, não produzem nada, além de mais farisaísmo.



Comentários