Cuidado com os Neo-Anglicanos
- Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
- 23 de abr. de 2018
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Padre Jorge Aquino
O Anglicanismo, hoje em dia, vive uma crise que acaba por dividi-lo entre aqueles que “estão” e aqueles que “não estão” “em comunhão” com a Sé de Cantuária. De um lado está a Comunhão Anglicana e do outro as chamadas Igrejas Anglicanas Continuantes (que sempre desejaram continuar sendo Anglicanas) que confrontam decisões e posturas assumidas por certos membros da Comunhão Anglicana, e as Igrejas Anglicanas de Convergência, que não utilizam o termo “Anglicano”, mas seguem com as mesmas marcas.
Ocorre que, além desses movimentos com já quase meio século, existem dezenas de pessoas criando igrejas “Anglicanas” por ai. Com a profusão e o surgimento de tantas igrejas anglicanas por todos os lados em nosso país, é importante que se registre algumas diretrizes para que o povo não seja enganado por aventureiros.
I.Vivemos em um país laico.
Isso significa, por óbvio, que não existe religião oficial no Brasil e que a criação de uma nova igreja ou religião é um direito constitucionalmente resguardado e albergado. Isso significa que qualquer pessoa pode criar e registrar uma igreja e chama-la de “Anglicana”.
II. Sobre a coerência de quem cria uma Igreja “Anglicana”.
A criação de uma igreja que leve o nome de “Anglicana”, para que se resguarde o mínimo de coerência com o nome, deverá ser acompanhada de alguns elementos fundamentais. Dentre eles, os principais são:
Uma liturgia que esteja associada ao Livro de Oração Comum. A Reforma na Inglaterra trouxe, além de Artigos de Fé, uma liturgia profundamente elaborada por Thomas Cranmer e que, ainda hoje é utilizada pelos Anglicanos ao redor do mundo.
Uma teologia que leve em consideração a Escritura, a razão e a tradição e que se aproxime dos Trinta e Nove Artigos de Religião da Igreja da Inglaterra.
As Escrituras Sagradas do Antigo e Novo Testamento reconhecidos como Palavra de Deus. Os Anglicanos levam muito a sério a Bíblia, tanto em sua liturgia quanto no que ensinam, sendo—lhes vetado ensinar ou exigir qualquer crença que não possa ser fundamentada nas Escrituras.
Os dois sacramentos do Batismo e da Eucaristia conforme ordenados por Cristo. Ainda que respeite e pratique os demais Ritos Sacramentais ou Sacramentos Menores, a realização da Eucaristia (na língua comum e com a dação das duas espécies) e do Batismo, são fundamentais para os Anglicanos.
A recepção dos três primeiros credos como resumos da fé cristã. Tanto o Credo Apostólico, quando o Niceno e o Calcedoniano são vistos pelos Anglicanos como resumos adequados de nossa fé.
A recepção das decisões centrais tomadas pelos quatro primeiros Concílios Ecumênicos. O que significa que os Anglicanos seguem a tradição Católica e primitiva de rejeitar o arianismo e de afirmar a crença na Santíssima Trindade conforme estabelecida nesses Concílios.
A manutenção do Episcopado Histórico como a ordem plena (além do diaconato e do presbiterado). Para tanto é importante que se mantenha a exigência estabelecida em Nicéia (325 aD) de que, pelos menos três bispos estejam presentes para a sagração de um bispo (Cânon 4º). Podemos também citar o 13º Cânon do Concílio de Cartago (394 aD), que declara: “Um bispo não deve ser ordenado senão por muitos bispos, mas se houver necessidade ele pode ser ordenado por três”, e o Segundo Concílio de Nicéia (787 aD), em seu primeiro cânon, que diz o mesmo. Isso significa que qualquer ordenação episcopal na qual não estejam presentes, pelo menos, três bispos com sucessão apostólica, é irregular e inválida. Como consequência, todos os gestos realizados por um bispo irregularmente e invalidamente sagrado são, de per si nulos e inválidos.
III. Acerca das exceções.
Fora dessa realidade exposta acima, o que se encontra é gente aventureira, mercadejando a Palavra de Deus e usando para isso o nome de uma Igreja que possui uma tradição milenar, um respeito inafastável e mais de 100 milhões de seguidores ao redor do mundo.
No entanto, se o que mais marca o “Anglicanismo”, enquanto Igreja Cristã, é sua disposição ecumênica, inclusiva e compreensiva, aliada à necessidade de valorizar os “laços de afeição” e, considerando que desde a Conferência de Lambeth 1998 os Bispos da “Comunhão” sinalizaram com a importância de uma conversa bilateral com as demais tradições Anglicanas, estou absolutamente convicto de que a união dos irmãos Anglicanos é a vontade de Deus. Mas caberá às estruturas de poder (os homens e suas circunstâncias) se submeterem ou não à vontade de Deus e evitar o “escândalo” que é a separação dos cristãos. Todo re-encontro, contudo, precisa se basear em um minimum minimorum, que creio, está devidamente enunciado acima. Estaremos dispostos a iniciar um diálogo?
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