
Padre Jorge Aquino.
Introdução: a chamada “Phoenix affirmations”, é um conjunto de doze afirmações feitas por um grupo de clérigos e leigos na cidade de Phoenix, Arizona, com o desejo de estabelecer os princípios que deveriam nortear a vida do cristão comum. Desta forma, este documento apresenta uma exposição de afirmações que giram em torno de três grandes elementos do ensino de Jesus: o amor à Deus, o amor ao próximo e o amor a si mesmo. Depois de apresentar cada um desses três tópicos gerais, as Afirmações de Phoenix fazem uma exposição sempre com quatro partes que se sucedem. Primeiro se afirma que: “Como Cristãos”, e segue-se um verbo; em seguida, vem uma afirmação, seguida de uma confissão e de uma fundamentação bíblica. É interessante registrar que as igrejas e organizações que subscrevem as “Phoenix affirmations”, geralmente se auto-proclamam Progressistas. Esta expressão parece dizer que a Igreja Cristã deve sempre olhar para frente, e não para o retrovisor. Observando com atenção este documento verificamos que ele possui uma introdução bastante reveladora.
Logo à princípio, as Afirmações de Phoenix ressaltam que o cristianismo americano, conforme está sendo vivido hodiernamente, tem pouca ou nenhuma relação com a fé histórica de seus ancestrais e, muito menos, com nossa própria fé, na condição de cristãos que confessa estar comprometido com os dons do Criador, sua revelação e com a morte e a ressurreição de Cristo. Em razão desse contraste, é necessário envidar todo esforço para dar fim a essa condição. E esse “basta” pretende ser dado por meio da quebra do silêncio, ou seja, através das afirmações que ficariam chamadas de Afirmações de Phoenix.
Desta forma, diz o texto das Afirmações de Phoenix: “Como pessoas que são cristãs com alegria e sem remorso, nós nos comprometemos completamente com o caminho do Amor. Trabalhamos para expressar nosso amor, como Jesus nos ensina, de três maneiras: amando a Deus, ao próximo e a si mesmo”. Desta forma, afirmar que amamos a Deus implica em alguns gestos concretos que serão objeto das Afirmações produzidas em Phoenix.
Para fundamentar o que fora dito até aqui, as Afirmações de Phoenix apresentam os seguintes textos bíblicos: O primeiro deles é o de Mateus 22:34-40. Aqui encontramos o que comumente conhecemos por “O grande mandamento”. Neste texto vemos um intérprete da lei testar Jesus perguntando acerca do grande mandamento da Lei. Ao que Jesus responde: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas”. O texto de Marcos 12:28-31 é similar ao primeiro, tendo como única diferença a expressão inicial: “O principal é: Ouve ó Israel, o Senhor, teu Deus, é o único Senhor”. Quanto ao texto de Lucas 10:25-28, temos aqui um encontro entre Jesus e um certo homem, intérprete da Lei que se levanta tentando por Jesus à prova e questionando sobre o que se deve fazer para herdar a vida eterna. Na resposta, Jesus cita o texto de Deuteronômio 6:5, apresentado acima como o principal mandamento, e encerra dizendo: “faze isto e viverás”. O texto de Levítico 19:18 possui um dos mandamentos acerca dos relacionamentos pessoais no qual diz: “Não te vingarás, nem guardarás ira contra os filhos do teu povo; mas amarás o teu próximo como a ti mesmo”.
Depois da apresentação inicial e dos textos apresentados, percebe-se que neste texto, os signatários destas Afirmações não somente se comprometem em seguir o caminho do amor, mas também em trabalhar para expressar este amor em seus três níveis: para com Deus, para com o próximo e para consigo mesmo. Depois desse preâmbulo, eis que seguem as declarações da Afirmações de Phoenix.
Afirmação 1 Andar plenamente no caminho de Jesus, sem negar a legitimidade de outros caminhos que Deus pode proporcionar à humanidade.
Como cristãos, encontramos despertar espiritual, desafio, crescimento e realização no nascimento, vida, morte e ressurreição de Cristo. Embora tenhamos aceitado o Caminho de Jesus como nosso Caminho, não negamos a legitimidade de outros caminhos que Deus pode fornecer à humanidade. Sempre que possível, buscamos um diálogo vivo com os de outras religiões para benefício mútuo e comunhão.
Afirmamos que o Caminho de Jesus se encontra onde quer que o amor a Deus, ao próximo e a si mesmo sejam praticados juntos. Quer o caminho tenha ou não o nome de Jesus, tais caminhos têm a identidade de Cristo.
Confessamos que nos afastamos do Caminho de Cristo sempre que deixamos de praticar o amor a Deus, ao próximo e a nós mesmos, ou afirmamos que o cristianismo é o único caminho, mesmo quando afirmamos que é o nosso caminho (Mateus 11:28-29; João 8:12; João 10:16; Marcos 9:40).
Comentário:
A primeira declaração feita pelas Afirmações de Phoenix nos diz que, amar a Deus implica em “Andar plenamente no caminho de Jesus, sem negar a legitimidade de outros caminhos que Deus pode proporcionar à humanidade”. Esta primeira afirmação se reduz, basicamente, a afirmar que só podemos amar à Deus se andarmos no mesmo caminho trilhado por Jesus sem, com isso, desconsiderar que Deus pode, legitimamente, utilizar outros caminhos para que cumpramos esse trajeto.
Assim, na condição de Cristãos, as Afirmações de Phoenix afirmam que nós reconhecemos que o caminho apresentado por Jesus é o “nosso caminho”, outros caminhos também podem legitimamente existir. Essa realidade deve nos levar a buscar um diálogo vivo com as outras religiões para benefício mútuo e comunhão. Além disso, esta primeira Afirmação também ressalta que o Caminho de Jesus somente pode ser encontrado no “amor a Deus, ao próximo e a si mesmo”, praticados conjuntamente. Em outras palavras, quer tenha ou não o nome de Jesus, estes caminhos possuem a identidade de Cristo. Esta afirmação, que é normalmente acusada de relativizar a posição de Jesus no caminho da salvação, na verdade é tanto uma recusa da postura exclusivista que afirma não haver salvação fora da igreja (extra ecclesian nulla salus), como também uma rejeição da postura inclusivista, de que todas as religiões são caminhos válidos em si. Na verdade, a postura apresentada pelas Afirmações de Phoenix nos parecem mais próximas da postura pluralista, que afirma que somente pela graça de Deus, em Cristo, se pode chegar à salvação. E isso pode acontecer em qualquer tradição religiosa em razão da soberania de Deus e de sua suprema graça. Lembremos da expressão criada pelo ilustre padre jesuíta, escritor, paleontólogo e teólogo Pierre Teilhard de Chardin, para quem “Tudo o que sobe, converge”. Assim, podemos dizer que é, sim, possível viver uma “vida crística” sem sequer termos conhecimento de quem foi Jesus.
Daí a primeira Afirmação encerrar com a indicação de que, sempre que deixamos de praticar o amor, nos três níveis que a Bíblia revela, nos afastamos do “Caminho de Cristo”. Para fundamentar essa Afirmação, o documento apresenta os seguintes fundamentos bíblicos: Mateus 11:28-29, que apresentam o convite de Jesus à todos os que estão cansados e sobrecarregados, pois Ele oferece o descanso para a alma. Em João 8:12 Jesus afirma que todos aqueles que o seguirem terão a luz da vida, já que Ele é a luz do mundo. Em João 10:16 Jesus afirma existirem ovelhas em outro aprisco, e que Ele deverá conduzi-las, afim de que exista apenas um só rebanho. Finalmente em Marcos 9:40 Jesus repreende a ideia de que a verdade é exclusividade apenas do grupo seleto que segue ao Senhor. Para Jesus, “quem não é contra nós, é por nós”.
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