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ACERCA DA SOLIDÃO

  • Foto do escritor: Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
    Reverendo Padre Jorge Aquino ✝
  • 21 de dez. de 2020
  • 5 min de leitura

Reverendo Padre Jorge Aquino.

Uma das características mais marcantes de nossa sociedade é a ambiguidade. Sim, vivemos em uma sociedade extremamente ambígua, e em vários aspectos. Aquele que eu gostaria de destacar neste texto tem a ver com a solidão. A ambiguidade se manifesta, por exemplo, no fato de termos centenas de “amigos” no nosso facebook ao passo em que, ao mesmo tempo, as pessoas se sentem cada vez mais sós. Quem, em algum momento de sua vida não se sentiu como o salmista que escreveu: “Por que estás abatida, ó minha alma? Por que te perturbas dentro de mim?” (Salmo 42:5). A solidão parece ser uma experiência comum que vem se agudizando nos últimos trinta anos. Fracis Bacon, o filósofo e ensaísta inglês (1561-1626), dizia que “Não há solidão mais triste do que a do homem sem amizades. A falta de amigos faz com que o mundo pareça um deserto”. E é neste deserto que vivem tantas pessoas, apesar de estarem cercadas de gente e com centenas de “amigos” em suas redes sociais. Eis a grande ambiguidade de nossa sociedade.

1. Mas, o que é solidão? Normalmente se define e solidão como “um sentimento no qual uma pessoa sente uma profunda sensação de vazio e isolamento. A solidão é mais do que o sentimento de querer uma companhia ou querer realizar alguma atividade com outra pessoa não por que simplesmente se isola mas por que os seus sentimentos precisam de algo novo que as transforme” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Solid%C3%A3o). O Dr. Alastair Campbel, editor do A dictionary of pastoral care (1995, p. 148), nos diz que a solidão é “a dor e o sentimento de inabilidade em satisfazer a necessidade humana básica de relacionamentos íntimos com outras pessoas”. Para os autores BUTLER e HOPE, a solidão se resume simplesmente na “falta de amigos íntimos” (1997, p. 138). No fundo, por trás de todas estas definições está a verdade inarredável de que o ser humano é um ser social e relacional, e que sem relacionamentos, ele simplesmente definha e morre.

2. A solidão não é uma boa conselheira. Muitas pessoas que vivem na solidão de suas vidas, sem relacionamentos profundos ou verdadeiros com alguém, acaba por ouvir os maus conselhos da solidão e ou bem querem “pagar” por uma companhia, o que acaba por aumentar seu sofrimento e sua solidão, ou “fugir” para outros caminhos bem mais destrutivos como as drogas ou a depressão. O Dr. R Jouvent, descrevendo a semiologia da depressão, nos diz que ela é composta pela “culpa, o desespero, a visão pessimista da existência e os sinais somáticos (insônia, astenia, modificações, para mais ou para menos, do apetite e do peso) completam o quadro clínico e existem em proporções variáveis de um sujeito para o outro. Atenção especial merecem as ideias de suicídio” (sic) (JOUVENT, In DORON & PAROT, 2000. p. 220). Dar ouvidos aos conselhos da solidão nunca é uma atitude sábia, justamente porque ela nos é anti-natural.

3. Infelizmente, quando estamos envolvidos pela solidão não compreendemos que existe uma sutil diferença entre ela e a solitude. Enquanto a primeira é destrutiva e má, a segunda é produtiva e boa. É importante e necessário fazer esta distinção. Creio que a seguinte citação é consegue estabelecer a diferença entre estes dois termos: “Solidão não é o mesmo que estar desacompanhado. Muitas pessoas passam por momentos em que se encontram sozinhas, seja por força das circunstâncias ou por escolha própria. Estar sozinho pode ser uma experiência positiva, prazerosa e trazer alívio emocional, desde que esteja sob controle do indivíduo. Solitude é o estado de se estar sozinho e afastado das outras pessoas, e geralmente implica numa escolha consciente. A solidão não requer a falta de outras pessoas e geralmente é sentida mesmo em lugares densamente ocupados. Pode ser descrita como a falta de identificação, compreensão ou compaixão” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Solid%C3%A3o).

Perceba, na solidão é possível que estejamos rodeados de gente ou não, enquanto na solitude há a exigência de se estar só. Mas a solitude é uma ação consciente e com um fim produtivo. É uma ação consciente de se ausentar da presença das pessoas visando um crescimento ou um aprofundamento existencial, espiritual ou intelectual.

Mesmo sem fazer uso da palavra solitude, Butler e Hope (1997, p. 141) entendem que “Estar à vontade consigo mesmo, sozinho, pode ser uma pausa repousante e geradora de energia. É no isolamento que às vezes se consegue buscar no âmago do próprio ser a inspiração necessária para muitas atividades criativas”. O solitário, por outro lado, até pode ter alguém ao seu lado, mas, porque a procura da companhia se fez apenas para que ele não se sentisse bem sozinho, já comprometemos, de início, o relacionamento.

4. Lendo as Escrituras, descobrimos que Deus se preocupa com nossa solidão. Por isso Ele disse: “Não é bom que o homem esteja só” (Gênesis 2:18). Deus, que é comunidade, nos fez com uma necessidade visceral de termos um(a) companheira(o) para toda a vida. Mas até aqui preciso fazer a distinção entre “companhia” e “companheiro”. Uma “companhia” é alguém que está ao seu lado em alguns momentos específicos e esporádicos. Alguém que você convida para acompanha-lo(a) em algum evento.

O “companheiro” é muito diferente. Indo muito além da mera companhia, o companheiro, é aquela pessoa que participa das ocupações, atividades, aventuras e do próprio destino de outra pessoa. Aliás, a própria palavra “companheiro” vem do latim companibus, que surge da junção de “cum + panis” e se refere às pessoas que comem o mesmo pão consigo. Esta pessoa estará ao seu lado em todos os momentos – nos melhores ou piores, as saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza – sendo seu esteio, sua base sólida, ouvindo seus reclamos, chorando com você e rindo ao seu lado, quando for preciso.

Sou grato por ter recebido de Deus uma companheira que, não apenas dorme ao meu lado (quantos casais vivem uma solidão à dois!), mas participa ativamente de minha vida em todos os aspectos. Às vezes nos surpreendemos porque acordamos diariamente às 4 da manhã e ficamos conversando até às 6, quando eu me levanto para preparar o café da manhã. O mesmo ocorre quando viajamos. Lembro de ter passado quase sete horas conversando com ela sobre todos os assuntos possíveis (economia, política, teologia, relacionamento, planejando o futuro, possíveis viagens, etc.) sem percebermos o tempo passar. Com segurança, afirmo, Deus me deu uma companheira para toda a vida.

Para concluir, lembro-me da figura do navegador Amyr Klink, que em 1984 atravessou solitariamente o Oceano Atlântico e em 1989 viajou até a Antártica e só voltou em 1991. Pois bem, esse ilustre navegador disse certa vez: “Quem tem um amigo, mesmo que um só, não importa onde se encontre, jamais sofrerá de solidão; poderá morrer de saudades, mas não estará só”. Ele fez uma distinção muito feliz entre solidão e saudade. Ele, apesar de isolado, nunca esteve só, porque sempre esteve em contato com as pessoas que amava.

Estes textos foram escrito para você, que se sentia só, mas que agora, está acompanhado(a) pela pessoa mais importante da sua vida. Aquela com quem você irá passar o resto de sua existência. Espero que vocês leiam juntos estes pequenos textos e tirem deles lições para suas vidas em comum.

Referência bibliográfica

CAMPBEL, Alastair V. A dictionary of pastoral care. Bristol: SPCK, 1995.

BUTLER, Gillian & HOPE, Tony. Guia para o domínio da mente. Rio de Janeiro: Campus, 1997.

DORON, Roland & PAROT, Françoise. Dicionário de psicologia. São Paulo: Atlas, 2000

SOLIDÃO. In: https://pt.wikipedia.org/wiki/Solid%C3%A3o, acessado em 14 de março de 2016.





 
 
 

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